4 de nov. de 2011

Mata dos Escoteiros

- Mara S.C.Chediak
Determinar os limites da antiga propriedade não é tarefa das mais fáceis. Entende – se sua extensão visualizando mentalmente o Mercado Municipal, o Estádio Elias Arbex, todo bairro Triângulo, bairro Chácara das Rosas, a Universidade Vale do Rio Verde.



O proprietário era Sizenando (Nandico) Martins Andrade e a fazenda chamava – se Chácara das Rosas, cuja sede ficava onde hoje encontramos o Supermercado GF. Dali, às tardes de Domingo, pessoas dispostas a uma boa caminhada, subiam até o alto do morro, pelo simples prazer de passear... Entre bichos e passarinhos, mata fechada e muita cobra, nascia a mina. A água limpa abastecia a fazenda, correndo a céu aberto, chegou a servir as lavadeiras do Triângulo e por muitos anos enchia a Caixa D’água daquele bairro, que por sua vez, abastecia os trens.

A maior dificuldade era captar essa água, lá em cima e abastecer a sede. Para amenizar o problema, fizeram uma cisterna, facilitando a vida das moças que carregavam a água em baldes, num trabalho de “formiguinhas”... Chegaram a instalar bombas hidráulicas, mas eram constantemente roubadas..
No pomar, só de jabuticabeiras eram 62, além de cinquenta e tantos outros pés de diferentes frutas. D. Noeme, esposa do Sr. Aureliano, vendia a produção de frutas e verduras da Chácara; com o produto, abastecia a despensa que alimentava filhos, sobrinhos e agregados (que moravam lá e estudavam na cidade). Depois, em tempos de guerra, loteou parte da propriedade para manter as filhas estudando em Taubaté.

Veio a crise de 1929 e com ela a “quebra” de muitos fazendeiros de café. Num acordo entre irmãos, “Seu” Nandico, irmão e avalista, assumiu as dívidas de Aureliano Martins Andrade numa troca: a Fazenda Campo Limpo pela Chácara das Rosas.

Com o falecimento do Sr. Aureliano e as filhas estudando em Taubaté, D. Noeme mais ainda se desdobrava. O filho, Aloísio, aos 15 anos consegue 19 meeiros para ajudar no trabalho do dia – a dia, ele mesmo “pegando no batente” até a idade adulta. Casando – se com dona Isaura, adaptaram uma casa que se transformou na residência onde vivem desde 1961 até hoje, onde criaram os filhos e onde recebem os netos.

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No final daquela década, aparece por ali um personagem misterioso: Isac, um mulato alto e forte. Morava dentro do tronco de uma árvore e cuidava do seu entorno, varrendo, limpando a mina, espantando bichos: sua presença alimentou a fantasia de Cidinha filha de Seu Aloísio, e seus amigos vizinhos durante anos. Usando um cesto enorme, vendia pão para um padeiro conhecido, talvez em troca dos sanduíches de mortadela que o alimentariam durante o dia... Misteriosamente como apareceu, foi encontrado morto na rua.

Aos poucos toda aquela propriedade foi sendo loteada, em função do progresso, do crescimento da cidade para aqueles lados e da urbanização. A doação da mata para a Prefeitura veio no meio desta situação. Para construir o colégio das freiras (hoje Unincor) foi doada uma parte grande e anos depois, já sob a reitoria do Prof. José Maria, a venda de parte do terreno acima do prédio da Universidade e nos anos 1995 para a firma Belvedere, de Belo Horizonte.

Em um dos muitos episódios de doações e cessões, um decreto de 1984 dá permissão de uso de parte da propriedade (por prazo indeterminado) ao Grupo de Escoteiros da cidade, reconhecido como de utilidade pública desde 1981. Naquele mesmo ano é iniciado o trabalho de construção da sede do Grupo, com apoio de empresas e de populares da cidade.

Em 1986, terminadas as obras, o Grupo se transfere para sua sede própria e dois anos depois a reserva ecológica ao lado da sede é entregue ao Grupo para ser desfrutada e preservada. Nasce então o que a comunidade tricordiana conhece por “Mata dos Escoteiros”.

A partir do ano de 2006 é firmado um convênio com a Unincor destinado a pesquisas nas áreas ambiental e histórica, com estagiários de Educação Física, Pedagogia e Biologia. Estudantes de todos os níveis frequentemente se organizam em excursões para passeios ecológicos ao lugar onde um riacho nasce de uma mina, desce a céu aberto, passa pela casa de Seu Aloísio e D Isaura, que acordam com os passarinhos e morrem de saudades da época em que tudo era diferente.

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