1 de dez. de 2011

O Beco da Fumaça

Nathália Rezende Naves*



No Rio de Janeiro o Calçadão de Ipanema, em Três Corações o Calçadão 18. Guardadas as proporções, cada cidade possui sua marca registrada.

“Nós devemos olhar seriamente a Arquitetura como o elemento central e abonador desta influência de ordem superior da natureza sobre as obras do homem. Podemos viver sem ela, rezar sem ela, mas sem ela não podemos recordar”.

É com essas palavras de John Ruskin, escritor e crítico de artes inglês, que começamos esse pequeno artigo sobre uma das ruas mais importantes de Três Corações: Luciano Pereira Penha. Alguns vão pensar que rua é essa? E a dúvida logo termina quando se diz: A rua 18 ou o Calçadão 18. 

Segundo a literatura memorialista que graça em nossa cidade essa rua está ali, estreita, desde o início, pra mais de 127 anos. Já foi rua Aristides Lobo e até Beco da fumaça. Talvez a padaria que deu origem ao nome Beco da fumaça tenha sido um dos primeiros pontos comerciais, junto com o açougue do Sr. João. Que avós e pais não conheceram o cine Zuza? A rua 18 foi e ainda é uma ótima localização, sempre movimentada dá a impressão de um formigueiro. Embaixo as lojas de artigos variados, lanchonetes e ambulantes que vendem de frutas da época a artesanatos diversos, em cima, a memória tricordiana guardada nas fachadas, corroídas pelo tempo, das poucas casas antigas que lembram os pioneiros de nossa cidade.

Na citação acima Ruskin diz que a arquitetura sofre a interferência da natureza, ou seja, das intempéries que pouco a pouco traçam o desgaste, a velhice. A opinião do crítico é contrária a restauração de patrimônios históricos pois, para ele o tempo é em si mesmo um grande arquiteto e sua influência se torna parte das construções. Não é contrário ao novo desde que algumas ‘ruínas’ permaneçam, supervisionadas para que os olhos do presente vejam nelas o seu passado, a sua história.

Hoje a rua 18 passa por uma reforma que visa a melhor circulação de pessoas e se preciso for de carros, como dos Bombeiros, em eventuais necessidades. A maior parte da fiação elétrica e telefônica tornou-se subterrânea, a rede de esgoto que antes era precária foi substituída por galerias com várias ligações que atendem às casas e estabelecimentos comerciais. Os canteiros e postes de concreto foram retirados, no lugar, algumas floreiras e poucos bancos, o piso será refeito, segundo algumas informações, parecido com o da Praça Odilon Rezende Andrade. Três canaletas serão feitas para o escoamento da água da chuva e ligarão as extremidades da rua. A previsão de entrega era dia 15 de novembro, mas ainda não foi concluída, ao que parece falta apenas a parte arquitetônica.

O tempo é um ‘senhor’ imprevisível que passa sem impedimento, tampouco sem pedir licença. As obras humanas são frágeis, por mais concreto que levem, perante sua atuação. Daí a necessidade de manutenção e preservação. O bem estar de todos está ligado à administração pública, educação e cultura de cada um. A cidade pertence a seu povo assim como seu povo pertence à sua cidade. Naquela rua estão depositadas as lembranças do passado, as ações do presente e as perspectivas do futuro. Juntas. 

*Professora de História, atriz e autora de teatro em Três Corações, apaixonada pela memória tricordiana.

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